No meio da tarde de ontem, ao subir a Rua Clóvis Huguenei, aqui em Cuiabá, esta escultura chamou-me a atenção, a ponto de atravessar a rua para vê-la melhor. Uma placa, como as que indicam ruas, tombada no chão, revelava se tratar de um Monumento a Maria Taquara. Fiz a foto com a Nikon S3500, e ao editar no Fotor apliquei um filtro Sunset e um efeito Retro/Sepia.
A placa fixada ao pé da estátua tem os seguintes dizeres:
MARIA TAQUARA
Na década de 40, viveu em Cuiabá, MARIA TAQUARA, muito alta, magra, negra, tinhosa, sisuda, esperta, maltrapilha e desembaraçada. Não tinha filhos. Sempre soube que a vida não seria fácil, ainda mais em uma sociedade conservadora. Mas foi neste contexto histórico que Taquara se transformou em uma Lenda da nossa cultura. Foi a primeira mulher a abolir saias. Ela viu na calça comprida a sua marca registrada. O motivo era a profissão, que exigia roupas práticas e resistentes para o trabalho no córrego da Prainha. Sempre com uma trouxa na cabeça, de casa dos patrões para sua casa e vice e versa. Não há registro de seu nome completo, data de nascimento e morte... simplesmente desapareceu.
MARIA TAQUARA... Apenas MARIA!!
Um dos tipos populares que se imortalizou na frase:
"De dia Maria Taquara... de noite Maria meu bem!!"
Novembro de 2009
Ali em volta, próximo da esquina das avenidas Tenente-Coronel Duarte (popularmente conhecida como Av. da Prainha) e Generoso Ponce (da qual a Clóvis Huguenei é uma continuação), nada mais consta sobre a homenageada. As outras informações que seguem obtive pesquisando agora de manhã na internet.
A escultura é de autoria do artista plástico Haroldo Tenuta, mineiro de nascimento, radicado em Cuiabá a partir dos anos 1940, e já falecido. A placa foi colocada após a restauração da escultura, derrubada por um vendaval em 2009. Reportagem do G1 Mato Grosso de abril de 2016 informa que a obra teria sido uma encomenda de João Balão, dono de um hotel na capital, para quem Maria Taquara "fazia serviços" (é a expressão usada no texto de Denise Soares).
Que serviços seriam? Bem, como a escultura indica e a placa dá a entender, Maria trabalhava como lavadeira de dia, enquanto à noite era "Maria meu bem". O que isso queria dizer, exatamente? A professora de semiótica Marília Beatriz Figueiredo Leite, ouvida pelo site Olhar Conceito em 2014, não tem dúvidas de que Maria Taquara seria, além de lavadeira, uma profissional do sexo; cito trecho do texto de Marianna Marimon: "Marília Beatriz Figueiredo Leite analisa um pouco desta figura folclórica e gosta de comentar que Cuiabá é uma das poucas cidades em que se ergueu uma estátua para uma prostituta".
Porém isto é desmentido por alguém que conheceu Maria pessoalmente: o escritor e historiador Aníbal Alencastro, hoje com 72 anos. Na citada matéria do G1, Alencastro afirma que, quando serviu no 16º Batalhão de Caçadores - atual 44º Batalhão de Infantaria Motorizado, localizado no início da Av. Lava-Pés, no bairro Goiabeiras -, o barraco de Maria ficava próximo ao quartel. "Ela não era prostituta. Os soldados pulavam o muro do quartel e dormiam com ela”, disse Alencastro ao G1. Há dois anos, ao falar ao Olhar Conceito, Alencastro foi mais eloquente a respeito:
“Durante a vigília da noite, os soldados deixavam seus postos e pulavam os muros para se encontrarem com ela, cujo barracão ficava ao lado do quartel. Depois, o sargento passava e olhava para os fuzis deixados do lado do muro e com isso, vários homens eram presos pelo abandono de posto. Tudo pela Maria Taquara.”
Em 2011, o poeta e compositor Moisés Martins publicou em seu blog a letra de sua música em homenagem à figura popular de Cuiabá:
Maria Taquara
Maria Taquara, Maria meu bem.
Mulher de todos, que não é de ninguém.
Taquara de dia, de noite meu bem,
Maria Taquara, não é de ninguém.
Muié de sordado, de Meganha também.
De dia Maria, de noite meu bem.
Maria é Cuiabá, Cuiabá é Maria
Não importa se é noite, não importa se é dia.
Maria é Taquara,
Taquara é Maria,
Avançada no tempo,
Mulher fantasia.
- Em abril deste ano, o artista plástico João Sebastião promoveu uma grande homenagem a Maria Taquara ao convidar outros 58 (!) artistas a criarem obras sobre a popular figura; o convite resultou na exposição Transmitologismo João e Maria, que esteve em cartaz na Casa do Parque de 14 de abril a 25 de junho. Saiba mais sobre a exposição aqui e aqui.
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